O Silêncio que Dói: o esquecimento de bartolomeu e a invisibilidade dos mais velhos

Na novela *Vale Tudo*, remake da obra originalmente exibida em 1988, um momento aparentemente simples revela uma das mais dolorosas realidades vividas por trabalhadores mais velhos: a invisibilidade diante do sucesso coletivo. O personagem Bartolomeu (Luís Melo), responsável por uma ideia criativa que salva uma importante campanha publicitária da agência em que trabalha, é solenemente esquecido pelos colegas mais jovens na hora da comemoração — ainda que tenha sido previamente convidado.
Enquanto todos festejam, brindam, fazem selfies e distribuem sorrisos em torno da vitória recém-conquistada, Bartolomeu permanece à margem. Eles saem animados e, no impulso da celebração, deixam o veterano para trás, como se sua presença não fosse essencial naquele momento. Ele não é chamado para a foto, não é lembrado na hora da saída, tampouco celebrado. Seu rosto, então, revela não apenas frustração, mas também uma dor íntima, que explode em palavras breves e contundentes:
“É difícil envelhecer. Mais difícil ainda é ser esquecido no momento que a gente mais esperou.”
Essa fala expressa uma espécie de luto — o luto pelo reconhecimento que não veio, pela valorização que foi negada, pela dignidade profissional esquecida em meio ao culto à juventude. Bartolomeu não pede honrarias; ele pede apenas um gesto mínimo de respeito e gratidão. Afinal, foi sua experiência, sensibilidade e dedicação que possibilitaram o êxito comemorado com tanto entusiasmo.
O episódio nos convida a refletir sobre o etarismo, preconceito estrutural contra pessoas idosas, ainda presente no mercado de trabalho. Em ambientes competitivos e tecnologicamente acelerados, a experiência de profissionais mais velhos frequentemente é tratada como um entrave ou algo dispensável. O que deveria ser fonte de sabedoria e solidez, passa a ser ignorado em favor do que é considerado “novo” ou “moderno”. A ausência de Bartolomeu da celebração da própria ideia é, simbolicamente, a exclusão de todo um grupo geracional que construiu os alicerces sobre os quais muitos jovens hoje caminham.
Mais do que um conflito geracional, a cena expõe um problema cultural: o apagamento da memória viva das organizações. A inovação, por mais necessária que seja, não precisa — nem deveria — ser construída sobre o esquecimento dos que vieram antes. A juventude traz energia, mas é a experiência que oferece visão estratégica, equilíbrio emocional e senso histórico. Quando ambos se encontram, há potência criativa verdadeira. Quando um lado é excluído, como ocorreu com Bartolomeu, instala-se um desequilíbrio que, aos poucos, corrói a cultura organizacional.
A fala emocionada do personagem não é apenas um desabafo ficcional; é o espelho de uma realidade que atinge milhares de trabalhadores brasileiros e, de forma ainda mais dura, os aposentados que, após décadas de contribuição, se veem relegados ao esquecimento. A cena de *Vale Tudo* é, portanto, mais que dramaturgia — é denúncia.
Fica o alerta: reconhecer as contribuições dos mais velhos não é um favor ou um gesto de gentileza. É uma obrigação ética, um valor civilizatório e uma estratégia inteligente de construção de ambientes profissionais mais humanos, mais justos e, sobretudo, mais íntegros.
Administrador Paulo Machado – CRA 5037